quinta-feira, março 09, 2006

 

Os Ordinários Sapateiros


Pode parecer lírico, mas era decente poder conceber a Assembleia da República como uma zona burgesso-free. O último reduto de um País grunho, um exemplo descomplexado para a Nação que a elegeu.

Mas nunca nada é exactamente como se deseja, certo?

Foi ver hoje, ainda o novo Presidente não tinha quase tomado posse, já uma manada se entretinha a alambazar-se de grosseria e ordinarice, desiludindo quem dela esperasse mais qualquer coisita.

E sobre "ordinarices", reporto-me (pelo menos) às de três tipos.

1ª - A ordinarice original de um ordinário de carreira, o Sr. Dr. Mário Soares.
O cadáver adiado (esta paga direitos, e não a mim...) insiste em fazer jus à sua merecida fama de beber chá de mindinho esticado mas ser... basicamente um ordinário vulgar.
É assim que se classifica alguém que no dia de hoje, tendo-se dado ao luxo de aceitar o convite para estar presente na tomada de posse do novo Presidente da República (se calhar afinal só lá foi para farejar uns aperitivos à pala) se dá ao luxo supremo de não cumprimentar o recém-empossado.
Que me digam que esta alimária está para além do bem e do mal (outra a pagar royalties), há malucos para tudo, mas não me confundam com gente desta.

2ª - A ordinarice militante de partidos políticos com assento na Assembleia da República (repararam que não disse "partidos democráticos"?) que mais enxovalham a Nação da casa da qual comem e bebem que as suas mal lavadas reputações.
Parece (se calhar fui eu que perdi esse episódio...) que estar sentado na Assembleia da República isenta os titulares dos respectivos cus do respeito pelas mais elementares educação, decência ou honra.
É que comunistas e bloquistas não aplaudirem o discurso de circunstância do novo Presidente da República, isso é lá com eles. (Sei eu lá com que vontade o PS aplaudiu algumas coisas, ou se ao PP ou ao próprio PSD apetecia estar ali a fazer claque...)
O que sei é que terminado o discurso da praxe lhes competia aplaudir o cidadão eleito, o titular, a circunstância, a dignidade, os presentes, os convidados, TUDO o que a cerimónia sempre encerra quando se realiza.
Mas estes gajos ainda devem ter família nos Super Dragões, pelo que é de espantar não terem VISTO a cerimónia de costas!

3ª - A ordinarice profissional encartada e graduada do Dr. Jaime Gama, Exmº Presidente da Assembleia da República.
Que no dia de hoje, na tal circunstância excepcional da tomada de posse de um Presidente, não resistiu a reeditar a história do pintor Apeles.
Aquele que, diz-se, precisando um dia de representar na tela uma sandália, pediu o conselho habilitado de um sapateiro. O solícito sapateiro lhe explicou o que lhe parecia melhor ou menos bem na pintura em curso, começando no plano do pé, mas entusiasmando-se pouco a pouco com o protagonismo da sentença e arrastando as suas achegas por aí acima, o pé porque assim, a perna porque assado... terá ouvido do pintor Apeles qualquer resposta como: "não suba o sapateiro acima da chinela".

Da mesma forma, o Dr. Jaime Gama inverte as grandezas e no primeiro dia de mandato presidencial faz o frete ao seu partido ensinando ao Presidente da República como se obra no seu ofício (o Dr. jaime Gama, com tantos anos de experiência de Presidência da República).

O novo Presidente que vá com calma a pegar no Governo, porque ninguém melhor que ele deve "saber valorizar o tempo e o procedimento adequados para as soluções dos problemas nacionais"; que a especialidadeb do Governo é o esqui.
O novo Presidente que não se ponha com avarias de meter o bedelho na governação, já que está encostado como Primeiro-Ministro, ou dito em língua de cama "Liberto da responsabilidade executiva que, há vinte anos, começou por deter, e durante uma década, mas compreendendo detalhadamente as suas vicissitudes, Vossa Excelência ascende agora à altíssima posição e responsabilidade de Presidente da República".
O novo Presidente, que nem lhe passe pela carola vir sequer à janela, porque "Ao atingir, com a sua eleição, e pela primeira vez, o patamar do puramente político e institucional, Vossa Excelência inicia um mandato inteiramente diferente, face a anteriores experiências pessoais". É dizer sim senhor não senhor, comer a tapioca e calar a boca.

Tudo isto vindo de um cromo da bola (semelhante a muitos parecidos com ele) a quem nunca se conheceu nada feito de valor, que justificasse um décimo da reverência que supostamente lhe é "devida" pelos viventes normais.

Há gajos muito ordinários.

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